Por Anthony A Hoekema
Temos visto que aquilo que caracteriza especificamente a
escatologia do Novo Testamento é uma
tensão subliminar entre o “já” e o “ainda-não”. O crente, assim ensina o Novo
Testamento, já está na era escatológica mencionada pelos profetas do Antigo
Testamento, mas ainda não está no estado final. Ele já experimenta a presença
do Espírito Santo em si, mas ainda espera por seu corpo ressurrecto. Ele vive
nos últimos dias, mas o último dia ainda não chegou.
Em capítulos anteriores, tocamos nesta tensão de várias
maneiras. Vimos que o Novo Testamento expressa
esta tensão em sua doutrina das duas eras: a era presente e a era
vindoura (veja pp. 28-30). Percebemos que a
compreensão da história que subjaz ao Novo Testamento implica na existência
desta tensão: continua havendo duas correntes de desenvolvimento na história -
a do Reino de Deus e a do reino do mal (acima,
pp.45-49). O próprio Reino de Deus, na verdade, só pode ser entendido à
luz desta tensão, como sendo uma realidade tanto presente como futura (acima, pp.66-73).
O papel do Espírito Santo na escatologia lustra mais a
tensão entre o que já somos e o que esperamos ser (abaixo,
pp. 74-90). Observamos isto especialmente em conexão com conceitos tais
como nossa filiação (pp. 80-83), o Espírito
como primícia (p.83), e o Espírito como penhor
e selo (pp.83-86).
Na verdade, é impossível entender a escatologia
Neotestamentária à desta
deste tensão. A tensão entre o já e o ainda-não está implícita nos
ensinos de Jesus. Porque Jesus ensinou que o Reino de Deus é tanto presente
como futuro, e que a vida eterna é tanto uma possessão presente como uma
esperança futura. Esta tensão mais tarde, também permeia os ensinos do Apóstolo
Paulo. Para estes Apóstolo, a vida de Jesus se auto-revela no tempo presente em
nossa carne mortal (2 Co 4.10, 11), mas a presença desta vida nova é provisória
e imperfeita, de modo que podemos referi-la tanto dela revelada, como podemos
falar dela como escondida (cp Cl 3.3; Rm 8.19,23). Por causa disso, às vezes,
Paulo escreve acerca da morada presente do Espírito numa linguagem alegre e
triunfante (Rm 8.9; 2 Co 3.18), enquanto que outras vezes ele fala acerca do
crente gemendo intimamente e anelando por coisas melhores (Rm 8.23; 1 Co 5.2) 1.
Esta tensão também é mencionada nas Epístolas
não-paulinas. O autor de Hebreus contrasta a primeira vinda de Cristo com a
segunda: “Cristo, tendo-se oferecido uma vez para sempre para tirar os pecados
de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o aguardam para a
salvação” (9.28). Pedro conecta a ressurreição de Cristo com nossa esperança
futura: “que nos regenerou para uma viva esperança mediante a ressurreição de
Jesus Cristo dentre os mortos, para uma herança incorruptível, sem mácula,
imarcescível, reservada nos céus para vós outros” (1 Pe 1.3,4). E João realça o
contraste entre o que somos agora e o que deveremos ser: “Amados, agora somos
filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que havemos de ser. Sabemos que
quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque havemos de vê-lo
como ele é” (1 Jo 3.2).
Contrariamente à opinião de alguns, esta tensão entre o
já e o ainda-não é também encontrada no livro de Apocalipse. Embora uma
discussão mais completa deste livro seja fornecida mais adiante, podemos notar
aqui que nem uma visão exclusivamente preterista deste livro, nem uma
exclusivamente futurista lhe faz jus completamente. A visão preterista afirma
que maior parte do que é encontrado no livro de Apocalipse ou já tinha
acontecido à época em que o livro foi escrito, ou estava para acontecer logo
após seu surgimento. A visão futurista, ao contrário, sustenta que a maior
parte do que está no livro não somente era futuro quando o livro foi escrito
mas, mesmo hoje, ainda não aconteceu. Nenhuma destas posições leva em conta a
tensão já-ainda-não, que permeia o livro inteiro. O livro do Apocalipse se
refere tanto ao passado como ao futuro. Ele constrói sua expectação pelo futuro sobre a obra que Cristo fez no
passado. Entre as várias referências do livro à vitória que Cristo conquistou
no passado, podemos citar as seguintes: 1.18; 5.5-7, 9,10; 12.1-5, 11. Entre as
referências deste livro à segunda vinda de Cristo encontram-se as seguintes:
1.7; 19.11-16; 22.7, 12, 20. O livro do Apocalipse, portanto, retrata a igreja
de Jesus Cristo como salva, segura em Cristo, e destinada para uma glória
futura - embora ainda sujeita a sofrimento e perseguição enquanto o noivo
demora.
Pelo fato de a tensão entre o já e o ainda-não ser um
aspecto tão importante da escatologia Neotestamentária, vamos continuar a
explorar mais algumas de suas implicações para nossa vida e pensamento de hoje.
(1) Esta tensão já-ainda-não caracteriza o que
geralmente denominamos de os “sinais dos tempos”. Por “sinais dos tempos”
entendemos eventos que têm de acontecer antes que Cristo retorne, incluindo
coisas tais como a pregação missionária da Igreja, a conversão de Israel, a
grande apostasia, a grande tribulação e a revelação do anticristo. Estes sinais
serão discutidos, com maior detalhe, mais adiante. Neste momento, entretanto,
podemos notar que esses sinais tomam parte da tensão já-ainda-não, uma vez que
apontam tanto para o que já aconteceu como para o que ainda está porvir. Todos
os “sinais dos tempos” apontam para a primeira vinda de Cristo no passado e
apontam, no futuro, para sua segunda vinda. Além disso, estes sinais não devem
ser considerados como acontecendo exclusivamente no tempo-final, imediatamente antes
da volta de Cristo, mas devem ser vistos como ocorrendo ao longo de toda a era
entre a primeira e a Segunda Vinda de Cristo2 . Embora estes sinais deixem lugar para um cumprimento
culminante futuro, imediatamente antes da volta de Cristo3, eles são
de tal natureza que serão encontrados ao longo da história da igreja no Novo
Testamento.
Como ilustração deste ponto, considere a pregação
missionária do Evangelho. Jesus disse: “E será pregado este evangelho do Reino
por todo o mundo, para testemunho a todas as nações. Então virá o fim” (Mt
24.14). Esta pregação do Evangelho, por isso, é tanto uma marca distintiva da
era na qual vivemos agora, como um sinal apontando no futuro para a Segunda
Vinda de Cristo. A pregação missionária do Evangelho é um sinal que nos lembra
a vitória de Cristo no passado e que antecipa seu retorno glorioso.
(2) A Igreja está envolvida nesta tensão. Uma vez
que a igreja é uma comunidade de pessoas que foram redimidas por Cristo, ela é
uma comunhão daqueles que não obstante serem um povo novo, são também pessoas
imperfeitas. Não se deve perder de vista nem a novidade nem a imperfeição. A
pregação, ensino, cuidado pastoral e disciplina praticados na igreja, portanto,
sempre têm de levar esta tensão em conta. O povo de Deus não deve ser tratado
como aqueles que ainda estão totalmente depravados, “completamente incapazes de
qualquer bem e inclinados para todo mal” 4, mas devem ser tratados e
considerados como novas criaturas em Cristo. Ao mesmo tempo, porém, deve ser
lembrado que o povo de Deus é ainda imperfeito. Por causa disso, os cristãos
deveriam lidar um com o outro como pecadores perdoados. Deve sempre haver uma
prontidão para aceitar e perdoar irmãos que pecaram contra nós. Além disso,
qualquer correção que deva ser feita, deveria acontecer no Espírito de Gl 6.1:
“Se alguém for apanhado em pecado, meus irmãos, vós que sois espirituais tendes
obrigação de o trazer ao bom caminho, sem qualquer complexo de superioridade,
para vos salvaguardar contra possíveis tentações” (Philips).
(3) Esta tensão deveria ser um incentivo para um
viver cristão responsável. A tensão contínua entre o já e o ainda-não
implica que, para o cristão, a luta contra o pecado continua ao longo da
presente vida. Mas esta é uma luta para se engajar, não na expectação da
derrota, mas na certeza da vitória. Nós sabemos que Cristo desferiu um golpe
mortal no reino de Satanás e que a condenação de Satanás é certa.
Nós já somos novas criaturas em Cristo, habitadas pelo
Espírito Santo, que nos fortifica de modo que realmente podemos “mortificar os
maus feitos do corpo” (Rm 8.13, NIV). Mas não podemos atingir a perfeição sem
pecado nesta vida. Nossa imperfeição contínua, entretanto, não nos dá uma
desculpa para viver irresponsavelmente, nem implica que devamos renunciar a tentar
fazer o que agrada a Deus. Na verdade, nós apenas podemos continuar a viver com
o ainda-não à luz do já.
Uma compreensão da força que é nossa, através da
habitação do Espírito Santo, deveria nos motivar a viver uma vida cristã
positiva e vitoriosa. A fé na transformação contínua que em nós é operada pelo
Espírito (cp 2 Co 3.18) deveria nos estimular em nossos esforços. Acima de
tudo, deveríamos ser encorajados pela convicção de que nossa santificação é, em
última instância, não uma conquista nossa mas dom de Deus, uma vez que Cristo é
a nossa santificação (1 Co 1.30).
Podemos considerar mais um aspecto nesta conexão. A
relação entre o já e o ainda-não não é de antítese absoluta, mas
antes de continuidade. O primeiro é o antegozo do último. O Novo Testamento
ensina que há uma conexão estreita entre a qualidade da nossa vida presente e a
qualidade da vida além-túmulo. Para indicar o modo pelo qual a vida presente
esta relacionada com a vida vindoura o Novo Testamento utiliza figuras tais
como o prêmio, a coroa, o fruto, a colheita, o grão e a espiga, semeadura e
ceifa (cp. Gl 6.8) 5. Conceitos como estes nos ensinam que temos uma
responsabilidade de viver para o louvor de Deus como o melhor de nossa
capacidade mesmo enquanto continuamos a não alcançar a perfeição.
(4) Nossa auto-imagem deveria refletir esta tensão. Por
auto-imagem quero designar o modo como uma pessoa olha para si mesma, seu
conceito acerca de seu próprio valor ou falta de valor. O fato de o cristão se
encontrar na tensão entre o que já possui em Cristo e o que ele ainda não
desfruta, implica que ele deveria ver a si mesmo como uma pessoa nova
imperfeita. Mas a ênfase deveria cair sobre a novidade, não sobre a contínua
imperfeição. Colocar a ênfase na imperfeição em vez de na novidade é viver no
Novo Testamento de cabeça para baixo. Conforme Oscar Cullmann comenta, para o
crente cristãos nos dias de hoje o já excede em peso ao ainda-não
5.
Porque continuamos a viver na tensão escatológica entre
o á e o ainda não, nós realmente não vemos ainda nossa novidade
em Cristo em sua totalidade. Nós vemos muito em nossas vidas que se assemelha
mais ao velho que ao novo. Por causa disso, fica um sentido no qual esta
novidade sempre é um objeto de fé. Mas a fé no fato de que somos novas
criaturas em Cristo é um aspecto essencial de nossa vida cristã.
Embora a tensão permaneça, é também verdadeiro que a
vida cristã é marcada por crescimento espiritual. O novo homem que vestimos,
como cristãos, está continuamente sendo renovado: “Não mintais um para o outro,
uma vez que vos despistes do vosso velho homem com suas práticas e vestistes o
novo homem, que está sendo renovado em conhecimento na imagem de seu criador”
(Cl 3.9,10, NIV). O cristão, portanto, deveria olhar para si mesmo como uma
nova pessoa em Cristo, pessoa que está sendo progressivamente renovada pelo
Espírito de Deus 7.
(5) Esta tensão nos ajuda a entender o papel do
sofrimento na vida dos crentes. “Por que sofre o justo?” é uma questão tão
velha quanto o livro de Jó. Uma resposta a esta questão é que o sofrimento, na
vida dos crentes, é uma manifestação concreta do ainda-não. O sofrimento
ainda acontece na vida de cristãos porque ainda não foram eliminados todos os
resultados do pecado. O Novo Testamento ensina que “através de muitas
tribulações, nos importa entrar no Reino de Deus” (At 14.22). Paulo conecta
nosso sofrimento presente com nossa glória futura (Rm 8.17,18). E Pedro
aconselha seus leitores a não se surpreender “com o julgamento penoso que
estais sofrendo como se algo estranho estivesse acontecendo a vós” mas antes
“alegrai-vos em participar dos sofrimentos de Cristo” (1 Pe 4.12, 13, NIV).
O episódio das almas debaixo do altar, em Apocalipse
(6.9-11), também nos ajuda a entender o problema do sofrimento na vida dos
crentes. João ouve as almas daqueles que foram mortos por causa da palavra de
Deus, clamando: “Ó Soberano Senhor... até quando não julgas nem vingas o nosso
sangue dos que habitam sobre a terra?” (v.10). a pergunta sobre porque Deus
permite injustiças tão terríveis acontecerem sobre a terra, requer uma
resposta. E a resposta é dada em dois estágios. Primeiro, àqueles que clamavam
foram dadas vestiduras brancas - um símbolo óbvio de vitória. Depois, é-lhes
dito para descansar um pouco mais, até que o número de seus conservos, que deveriam
ser mortos, seja completado (v.11). Assim, o povo de Deus continuará a sofrer
injustiça até o fim desta era - contudo, aqueles que sofrem e morrem por causa
de Cristo receberão suas vestiduras brancas da vitória.
Por causa disso, temos de ver o sofrimento dos crentes à
luz do eschaton, ocasião em que Deus enxugará todas as lágrimas dos
nossos olhos e quando não mais haverá sofrimento e morte (Ap 21.4).
Entrementes, sabemos que Deus tem seus propósitos para permitir a entrada do
sofrimento na vida de seu povo. Paulo nos ensina, em Romanos 5, que o
sofrimento produz perseverança, a perseverança produz caráter e o caráter
produz esperança (vs. 3,4). E o autor de Hebreus, embora admitindo que a
disciplina e o sofrimento não parecem ser agradáveis na hora em que são
experimentados, nos conta que tal disciplina mais tarde “produz uma colheita de
justiça e paz para aqueles que por ela foram treinados” (12.11, NIV) 8.
(6) Nossa atitude para com a cultura está relacionada
com esta tensão. H. Richard Niebuhr em seu
livro Christ and Culture (Cristo e a Cultura) 9,
aponta várias abordagens para com a cultura que foram utilizadas por diversos
grupos cristãos no passado, variando desde rejeição total até aceitação
acrítica da produção cultural de não-cristãos, com numerosas posições
intermediárias. Aplicando o conceito da tensão já-ainda-não à questão
das conquistas culturas, tanto de crentes como de descrentes, ajudaremos a
lança alguma luz sobre este eterno problema.
É geralmente entendido, por muitos cristãos, que o
relacionamento entre o mundo presente e a nova terra que está porvir é de
descontinuidade absoluta. A nova terra, pensam muitos, cairá como uma bomba em
nosso meio. Não haverá nenhum tipo de continuidade entre este mundo e o
vindouro; tudo será totalmente diferente.
Esta compreensão, porém, não faz jus ao ensino das
Escrituras. Há tanto continuidade como descontinuidade entre este mundo e o
vindouro 10. O princípio aqui envolvido está bem expresso em
palavras que foram freqüentemente usadas por teólogos medievais: “A graça não
destrói a natureza mas a restaura” 11. Em sua atividade redentora,
Deus não destrói as obras de suas mãos mas as limpa do pecado e as aperfeiçoa,
a fim de que possam finalmente alcançar o alvo para o qual ele as criou.
Aplicado a este problema, esse princípio significa que a nova terra que
aguardamos não será totalmente diferente da terra atual, mas será uma renovação
e glorificação da terra na qual vivemos agora.
Já observamos, anteriormente, figuras neotestamentárias
que sugerem que aquilo que os crentes fazem nesta vida terá conseqüências na
vida porvir - figuras como as da semeadura e ceifa, grão e espiga,
amadurecimento e colheita. Paulo ensina que uma pessoa pode construir sobre a
fundação da fé em Cristo, com materiais duráveis como ouro, prata ou pedras
preciosas, de modo que na consumação sua obra possa sobreviver e ele possa
receber uma recompensa (1 Co 3.10-15). O livro do Apocalipse fala acerca das
obras que seguirão aqueles que morreram no Senhor (14.13). Fica claro, de
passagens como esta, que aquilo que os cristãos fazem para o Reino de Deus
nesta vida tem significado também para o mundo porvir. Em outras palavras, há
uma continuidade entre o que é feito para Cristo agora e o que deveremos
desfrutar no futuro - uma continuidade expressa no Novo Testamento em termos de
galardão ou gozo (cp 1 Co 3.14; Mt 25.21,23).
Mas, que dizer acerca da produção cultural dos
não-cristãos? Devemos simplesmente renegar tais produtos como sem valor porque
não foram produzidos por crentes e não foram conscientemente dedicados à glória
de Deus? Os cristãos que tomam esta atitude, falham em apreciar a obra da graça
geral de Deus no mundo atual, através da qual mesmo homens não-regenerados são
capacitados para fazer contribuições válidas para a cultura mundial.
“Toda verdade é de Deus; consequentemente, se homens
iníquos disseram qualquer coisa que seja verdadeira e justa, não devemos
rejeitá-la; porque ela veio de Deus 12.
Sempre que depararmos com estes assuntos em escritores
seculares, deixemos essa admirável luz da verdade que neles brilha nos ensinar
que a mente do homem, embora decaída e pervertida em sua inteireza está mesmo
assim vestida e ornamentada com os excelentes dons de Deus. Se consideramos o
Espírito de Deus como a única fonte da verdade, nunca devemos rejeitar a
verdade em si, nem menosprezá-la pareça como for, a não ser que desejemos
desonrar o Espírito de Deus. Porque, em tendo os dons do Espírito em pouca
estima, desprezamos e rejeitamos o próprio Espírito” 13.
Com relação à cultura não-cristã,
portanto, temos de lembrar que o soberano poder de Cristo é tão grande que ele
pode governar em meio a seus inimigos, e fazer com que aqueles que não o
conhecem façam contribuições à ciência e à arte, contribuições que servirão à sua
causa. Os poderes despertos pela ressurreição de Jesus Cristo estão ativos no
mundo de hoje! O governo soberano de Cristo sobre a história é tão maravilhosos
que ele pode fazer até seus inimigos louvá-lo, embora eles o façam
involuntariamente. E quando lemos, no livro do Apocalipse, que os reis das
nações da terra deverão trazer sua glória para a nova Jerusalém (21.24,26),
concluímos que haverá alguma continuidade até entre a cultura do mundo atual e
a do mundo vindouro.
A tensão entre o já e o ainda-não, portanto, implica em que
não devemos desprezar o que o Espírito de Deus capacitou a homens
não-regenerados produzirem, mas devemos avaliar todos esses produtos culturais
à luz dos ensinos da Palavra de Deus. Podemos usar em gratidão qualquer coisa
de valor da cultura deste mundo, desde que a usemos com discriminação.
Como cristãos, acima de tudo, temos de
fazer o que melhor podemos para continuar a produzir uma cultura genuinamente
cristã: literatura cristã, arte, filosofia, uma abordagem cristã da ciência, e
assim por diante. Mas não devemos esperar alcançar uma cultura totalmente
cristã deste lado do eschaton. Uma vez que ainda não somos o que devemos
ser, todos os nossos esforços em estabelecer uma cultura cristã serão apenas
uma aproximação.
Para dar certeza, embora haja uma
continuidade entre o mundo presente e o mundo por vir, a glória do mundo
vindouro superará em muito a glória do mundo presente. Porque:
Nenhum
olho viu,
Nenhum
ouvido ouviu,
Nenhuma
mente concebeu
O
que Deus tem preparado para aqueles que o amam
(1 Co 2.9, NIV).
Resumindo o que foi desenvolvido neste
capítulo, concluímos que toda a nossa vida cristã deve ser vivida à luz da
tensão entre o que já somos em Cristo e o que um dia esperamos ser. Olhamos, no
passado, com gratidão, para a obra concluída e a vitória decisiva de Jesus
Cristo. E olhamos para o futuro com ansiosa antecipação da Segunda Vinda de
Cristo, quando instauraremos a fase final de seu Reino glorioso, e traremos à
plenitude a boa obra que ele começou em nós 14.
Notas do Capítulo 6
1. Ver também H.
Riderbos, Paul, pp. 169-175.
2. Cp. G
Berkower, Return, Cap. 8, e veja adiante, pp.
3. Isto se aplica
particularmente à manifestação do anticristo. Embora desde a primeira vinda de
Cristo sempre tenha havido anticristos no mundo (veja 1 Jo 2.18,22), o Novo
Testamento também nos ensina a aguardar um anticristo único e final no futuro
(veja 2 Ts 2.3-10).
4. Heidelberg
Catechism (Catecismo de Heidelberg), questão 8.
5. Veja H. Berkhof, Christelijk Geloof,
Nijkerk: Callenbach, 1973, p.511.
6. O Cullmann, Salvation,
p.183.
7. As implicações
da nossa fé cristã para nossa auto-imagem estão mais exploradas em minha obra: The
Christian Looks at Himself (O Cristão Olha para Si Mesmo).
8. Sobre o
assunto do sofrimento e martírio na vida dos crentes, veja Berkouwer, Return,
pp. 115-122.
9. “Gratia non tollit sed reparat naturam”.
10. Commentary on the Epistles to Timothy, Titus,
and Philemon (Comentário das Epístolas a
Timóteo, Tito e Filemon), transcr W. Pringle, Grand Rapids: Eerdmans, 1948, de
Tito 1.12, pp. 300, 301.
11. Institutas, ed., J. T. McNeill trasncr., F.L.Battles, Phidadelphia:
Westminster, 1960) II, 2, 15.
12. Para uma
discussão mais ampliada da tensão do “já-ainda-não”, veja Berkouwer, Return,
pp.20-23, 110-115, 121, 122, 138, 139; Cullmann, Salvation, pp. 32,
172-185; Hamilton, The Holy Spirit and Eschatology in Paul (O Espírito
Santo e a Escatologia em Paulo), pp. 39, 87; W. Manson, “Eschatology in the New
Testament” (A Escatologia em o Novo Testamento), pp. 7, 9-13; Ridderbos, Paul,
pp. 230, 231, 249-252, 267-277; Shires, The Eschatology of Paul in the Light
of Scholarship (A Escatologia de Paulo à luz da Erudição Moderna), pp.18,
162, 163, 169, 226.
Fonte: A Bíblia e o
Futuro, por Anthony A
Hoekema – Editora Cultura Cristã
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