Paulo era um
pregador, um evangelista. Seu alvo era "por todos os modos, salvar
alguns... por causa do evangelho" (1 Co 9.22,23). Em Éfeso, encontrou uma
porta aberta para realizar seu chamado. Ali havia pessoas ouvindo a pregação do
evangelho ministrada por ele, tanto pública como particularmente (At 20.20).
Conseguira uma audiência.
Paulo descobriu que
a oportunidade em Éfeso era "grande". Porém, não significava que a
tarefa seria fácil. Paulo não poderia simplesmente pendurar uma placa, abrir as
portas e ver uma igreja desenvolver-se e crescer. As oportunidades eram de
engajar-se em diligente trabalho ministerial. Relembrando seu tempo em Éfeso,
Paulo testemunhou: "Por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar,
com lágrimas, a cada um" (At 20.31). Quantos pastores, hoje, podem dizer a
mesma coisa? Quantos consideram uma oportunidade destas como uma legítima
responsabilidade pastoral?
A oportunidade que
Paulo julgava grande consistia no privilégio de gastar-se continuamente pela
causa do evangelho. Era a oportunidade de chorar pelas almas de homens e
mulheres; de pregar e ensinar o evangelho; de anunciar aos efésios "todo o
desígnio de Deus" (At 20.27).
O que fez de Éfeso
uma tão maravilhosa oportunidade não foi a facilidade do trabalho, ou o clima,
ou o nível educacional do povo, ou o salário e os benefícios. Não! O que a
tornou tão atraente para Paulo foi o fato de que Deus o colocou tão
providencialmente ali, em meio a tantas pessoas necessitadas. E, como um
ministro de Cristo, estava convencido de que no "evangelho da graça de
Deus" (At 20.24) tinha a resposta às suas necessidades.
As pessoas a quem
Paulo teve oportunidade de ministrar, em Éfeso, podem ser divididas em, pelo
menos, três categorias; e ainda hoje encontramos cada uma destas categorias.
Chegando a Éfeso,
Paulo encontrou doze discípulos que conheciam apenas o "batismo de
João" (At 19.1-3). Se estes eram pessoas realmente convertidas ou não, é
um assunto que pode ser discutido. Por um lado, a designação de
"discípulos" (v.l), feita por Lucas, parece indicar que já eram
crentes. Por outro, sua ignorância quanto ao Espírito Santo e a instrução que
lhes deu Paulo sugerem que tinham necessidade de conversão (vv.3,4). Seja qual
for o caso (e, teologicamente, poderia ser qualquer deles), haviam recebido
apenas um ensino parcial sobre Cristo e a salvação. Precisavam de mais
instrução. Como Apolo, necessitavam que lhes fosse exposto "com mais
exatidão... o caminho de Deus" (At 18.26). Quando Paulo fez isto, abraçaram
a verdade e ajustaram a ela as suas vidas.
Ao invés de
sentir-se oprimido ou desanimado pelas dificuldades que estes discípulos
apresentavam, Paulo tomou-as como uma oportunidade para ensinar-lhes mais
completamente o evangelho de Cristo. Corrigiu o errôneo pensamento deles e
acrescentou mais informações aos seus entendimentos, até então incompletos.
Este tipo de
ministério é necessário ainda hoje. Em cada igreja há seguidores do Senhor,
sinceros e dedicados, que foram parcial ou incorretamente ensinados. Seu
conhecimento não é tão amplo quanto sua experiência. Precisam ser firmados na
fé. Quando chegam a um conhecimento da verdade, sua perspectiva muda;
reconhecem mais da graça maravilhosa de Deus, que os trouxe à salvação.
Outros, que Paulo
encontrou em Éfeso, poderiam ser melhor descritos como religiosos
não-convertidos. Eram os judeus, a quem Paulo em primeiro lugar pregou o
evangelho, conforme seu costume (At 19.8). Tais como os religiosamente perdidos
de qualquer geração, estas pessoas se consideravam seguras por causa de seu
comprometimento a certos deveres cerimoniais.
Assemelham-se ao
irmão mais velho do filho pródigo, na parábola de Jesus. Estão convencidos de
que seu serviço e obras (ou posições e afiliações) merecem a aceitação do Pai
(Lc 15.29). E mais, sentem-se ameaçados e acusados por qualquer um que insista
ser a salvação totalmente pela graça de Deus.
Paulo não ignorou os
religiosos não-convertidos. Viu-os como um grande campo missionário. Afinal,
ele mesmo havia sido um deles. Visto que ele próprio fora salvo pela graça,
estava convencido de que a graça de Deus poderia alcançá-los também. Portanto,
pregava-lhes o evangelho e apresentava-lhes o único caminho de salvação.
Há evidências de que
alguns judeus converteram-se e tornaram-se parte da igreja em Éfeso. Mas também
há indicação de que "alguns deles se mostravam empedernidos e
descrentes". Além disto, falavam "mal do Caminho diante da
multidão" (At 19.9). O verdadeiro reformador inevitavelmente encontrará
oposições e críticas por parte de alguns. Paulo não permitiu que isto o
afastasse de seu propósito; portanto, também deveríamos permanecer firmes em
nossos bons propósitos. Se alguns se recusam a crer e tornam-se críticos quanto
ao objetivo e conteúdo da pregação, há outros que a receberão e serão
transformados. Por amor aos sinceros, não devemos ser dominados pelos críticos.
Como Paulo, devemos estar dispostos a suportar tudo "por causa dos
eleitos, para que também eles obtenham a salvação que está em Cristo Jesus, com
eterna glória" (2Tm 2.10).
Além de pregar aos
parcialmente ensinados e aos religiosos não-convertidos, Paulo teve grande
oportunidade de ministrar a muitos que não professavam estar em paz com Deus. O
apóstolo sentia um profundo amor por aqueles que eram obviamente
não-convertidos. A presença de muitos gentios era, em grande parte, a razão de
prolongar sua estada em Éfeso.
A correta
mentalidade reformadora nunca é destituída de genuína compaixão pelas pessoas espiritualmente
perdidas. Não é suficiente orientar os crentes que não possuem conhecimento
completo e enfrentar os hipócritas religiosos. O pastor, que se preocupa com a
reforma, deve também ver os campos brancos para a colheita. Precisa cultivar o
amor pelos pecadores, que reflete o próprio coração de nosso Senhor.
No ardor da batalha
em favor da verdade de Deus, envolvidos na correção de noções equivocadas sobre
o evangelho e na exposição do erro da crença falsa, é grande a tentação de
perdermos de vista os campos da colheita. O pastor e a igreja comprometidos à
reforma completa e bíblica, nunca ficarão satisfeitos ao verem uma obra de
santificação entre os crentes desacompanhada de uma obra de regeneração entre
os não-crentes.
A verdade
humilhadora sobre o evangelismo, mas repleta de esperança, é que um semeia e
outro rega, mas somente Deus dá o crescimento. A obra de regeneração está além
da habilidade humana.
É uma atividade
soberana de Deus. "O vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes
donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido do Espírito"
(Jo 3.8). O evangelismo, ou seja, levar o evangelho aos não-convertidos, é
nossa responsabilidade. O Espírito usa o evangelho para regenerar os
não-crentes. Portanto, em completa dependência do Espírito Soberano, devemos
indiscriminadamente semear o evangelho, em nossa comunidade e ao redor do
mundo.
Paulo preferiu
anunciar o evangelho àqueles que nunca o haviam escutado (Rm 15.20,21). Não
permitiu que nada o desviasse do grande privilégio e da responsabilidade de
fazer discípulos de todas as nações. O evangelismo nunca deve colocar de lado o
trabalho de reforma. Os discípulos, no livro de Atos, nunca o desprezaram;
enfrentavam e corrigiam os problemas na igreja, sem deixar de lado seus contínuos
esforços evangelísticos. A reforma genuína sempre incluirá uma ênfase sadia no
evangelismo.
Fonte: Desafio à Reforma, Thomas K. Ascol - Editora Fiel